Tele Trabalho

A Consolidação das Leis Trabalhistas passou por uma grande mudança com advento da lei nº 13.467/2017, visando adequar sua redação as novas relações laborais, tecnologia e profissões. Isto pois, muitos trabalhos realizados hoje sequer existiam nas últimas décadas, ou a forma como é atualmente realizado se alterou com o tempo.

Por exemplo, a cerca de vinte anos realizar uma reunião por vídeo-chamada com integrantes de São Paulo, Tóquio, Nova Iorque e Paris seria tido como uma obra de ficção cientifica ou um desenho dos Jetsons. Utilizar um “comunicador-portátil” que além de telefonar, receba e envie fotos, dados, documentos, bem como expõe a localização exata, seria apenas um acessório do James Bond. Hoje, tais tecnologias são comuns ao nosso dia-a-dia e muitas vezes as temos como indispensáveis.

Desta mesma forma falar em trabalho fora das dependências da empresa, em casa, cafés, centros de cooworking, era algo pouco usual, mas atualmente tem sido extremamente comum e difundido.

Antes da Reforma a previsão para este tipo de trabalho se dava no termos do Artigo 62, I da CLT , o qual excluía ao regime de horas extras os empregados que exercem atividade externa incompatível a fixação de horário de trabalho:

Art. 62 - Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo

I - os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados;

Todavia, com as novas formas de trabalho e tecnologia, muitos dos trabalhos realizados externamente, tal como em home office, toraram-se passiveis ao controle de jornada, gerando assim interpretações diversas nos tribunais, tanto para a compatibilidade como pela incompatibilidade.

Com a reforma trabalhista o legislador buscou diferenciar o Teletrabalho ao trabalho externo, vindo a incluir o Capitulo II-A à CLT. Nos termos do Art. 75-B da CLT, define-se Teletrabalho como “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.

Bem verdade o teletrabalho é desempenhado em local fixo, diferentemente do trabalho externo cuja característica predominante é o deslocamento, impossibilitando o devido controle de jornada.

Pela redação legal, desprende-se o entendimento de que o Teletrabalho deve ser compatível ao controle de jornada, afinal se assim não fosse configurar-se-ia como trabalho externo. Todavia ainda, o legislador o excluiu ao regime de controle de jornadas, nos termos do Artigo 62, III, ou seja, a jornada é compatível ao controle, porém não é abrangido pelo regime.

Em razão a dubiedade da norma, o enunciado 7.2 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, realizada pelo ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), vem com a intenção de pacificar o entendimento de que a inclusão do teletrabalho ao artigo 62 da CLT, fere a Constituição Federal e o Protocolo de San Salvador.

7.2 Duração do trabalho

TELETRABALHO. HORAS EXTRAS.

São devidas horas extras em regime de teletrabalho, assegurado em qualquer caso o direito ao repouso semanal remunerado. Interpretação do art. 62, III e do parágrafo único do art. 6o da CLT conforme o art. 7o, XIII e XV, da Constituição da República, o artigo 7o, "e", "g" e "h" protocolo adicional à convenção americana sobre direitos humanos em matéria de direitos econômicos, sociais e culturais ("Protocolo de San Salvador"), promulgado pelo Decreto 3.321, de 30 de dezembro de 1999, e a Recomendação 116 da OIT. (Enunciado Aglutinado no 2 da Comissão 6)

Ainda que não os enunciados do ANAMATRA não possuam poder vinculante, é possível verificar que os magistrados e tribunais tenderão em respeitar o entendimento entabulado.

Outro ponto de discussão se dá quanto ao custeio dos equipamentos e estrutura para manter condições de teletrabalho. Nos termos da legislação artigo 75-D as mesmas serão acordadas pelas partes e previstas em contrato, porém sem expor de maneira expressa.

Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.

O Enunciado 7.1 vem suprir essa falta, expondo que o trabalhador não pode assumir os custos e riscos do empregador, sendo, portanto, este o responsável pelos mesmo. Expõe ainda que é impreterível a presença de informações nos contratos de trabalho quanto a estrutura necessária e forma de reembolsos.

7.1 Custos do empreendimento

TELETRABALHO. CUSTEIO DE EQUIPAMENTOS.

O contrato de trabalho deve dispor sobre a estrutura e sobre a forma de reembolso de despesas do teletrabalho, mas não pode transferir para o empregado seus custos, que devem ser suportados exclusivamente pelo empregador. Interpretação sistemática dos artigos 75-D e 2o da CLT à luz dos artigos 1o, IV, 5o, XIII e 170 da Constituição da República e do artigo 21 da Convenção 155 da OIT. (Enunciado Aglutinado no 1 da Comissão 6)

Por fim o legislador buscou isentar o Empregador quanto a responsabilidade por danos ao empregado, nos termos do artigo 75-E.

Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.

Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.

Todavia, tanto o termo de responsabilidade previsto no parágrafo único da norma citada, como a adequação do ambiente de trabalho as normas de saúde e segurança no trabalho também são da empregadora, são objetos aos enunciados 7.3 e 7.4 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho.

7.3 Responsabilidade civil do empregador por danos

TELETRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR POR DANOS.

A mera subscrição, pelo trabalhador, de termo de responsabilidade em que se compromete a seguir as instruções fornecidas pelo empregador, previsto no art. 75-E, parágrafo único, da CLT, não exime o empregador de eventual responsabilidade por danos decorrentes dos riscos ambientais do teletrabalho. Aplicação do art. 7o, XXII da Constituição c/c art. 927, parágrafo único, do Código Civil. (Enunciado Aglutinado no 3 da Comissão 6)

7.4 Meio ambiente do trabalho

TELETRABALHO. CONTROLE DOS RISCOS LABOR-AMBIENTAIS.

O regime de teletrabalho não exime o empregador de adequar o ambiente de trabalho às regras da NR-7 (PCSMO), da NR-9 (PPRA) e do artigo 58, § 1o, da Lei 8.213/91 (LTCAT), nem de fiscalizar o ambiente de trabalho, inclusive com a realização de treinamentos. Exigência dos artigos 16 a 19 da convenção 155 da OIT. (Enunciado no 1 da Comissão 6)

Conforme exposto os enunciados apresentados não possuem efeito vinculante formal, porém informalmente é comum os magistrados utilizar tais posicionamentos em seus julgados.

Teletrabalho é condição de trabalho que vem crescendo ano a ano. Sua inclusão expressa à Consolidação das Leis de trabalho externalizam a importância dada pelo legislador ao tema, porém, através da análise sistemática das normas legais, verifica-se a existência de conflitos e omissões.

Publicado por Dra. Gabriel Montagna em 01/12/2018